sábado, 30 de julho de 2011

A superficie do poço


Esse reflexo da moça
Na superficie da poça
Olhos rasos
Mãos finas
Cabelos ralos
É vento que não apaga fogo, moça
É brasa que não esquenta
Passo leve
Sem pegadas
Sem marca
Ou cicatriz
É uma leve torcida de nariz
Dar de ombros
Largar de mão
A moça é trampolim à dois palmos do chão
Linha reta em pulsar de coração
O amor dela vai pra sempre em mim
Como tatuagem de chiclete
Mato sem jardim
A saudade é um lembrete em porta de geladeira
Sua cura em dez gotas de dipirona
Pois saiba, moça
Que cheguei ao meu limite
Ando cansado, embora moço
Cheguei eu
Na superficie do poço.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Choro pop





Me sento de frente pra rua, observo o movimento dos carros, das pernas apressadas. Aqui nenhuma pressa, só um “pingar”, um gotejamento na alma esperando calmamente a hora de transbordar. É relativamente cedo, o sol ainda não foi embora e o apresentador de todas as desgraças alheias ainda não deu as caras pela TV. Dizem que a dor dos outros ameniza um pouco a nossa própria dor, então peço uma cerveja e me dirijo a uma máquina calada nos fundos do bar. Ela me olha como se me conhecesse de longa data. Enfio uma nota pela boca dela e em sua tela aparecem tantas opções de choros e tristezas, tantos cortes de cabelo diferentes e roupas cafonas, fora de moda a milênios, queria eu, que a vida tivesse me dado metade das opções que a máquina me dá.
Estão lá: Richie, John, Bob, Johnny, Robert, Rod e tantos outros. Eu os conheço, eles nunca ouviram falar de mim. Aperto a cara de Joe Lynn e peço que compartilhe um pouco de sua dor comigo, nunca tive a pretensão de que ele ouvisse a minha, ele fala demais e quase não deixa um espaço pro sintetizador aparecer, porém possui bela voz. De volta a minha mesa, esqueço um pouco meus problemas e tento imaginar o que aflige o meu amigo dentro da caixa de som. Será que ele já superou essa dor? Ele finalmente se casou com Caroline e vive numa bela casa de madeira, tem quatro filhos e honra com sua hipoteca? Há vinte anos ele sofre pela mesma garota, cresce rapaz! Eu até entendo que deva ser difícil, um dia tocar pra grandes estádios e hoje ter que viver dentro de uma maquininha. Você não vive de royalties? Mesmo só tendo um sucesso, imagino que deu pra ganhar algum dinheiro, não? Você reclama de barriga cheia! Vive de Royalties, queria ver se fosse como eu, e tivesse que se virar com o seguro desemprego, seis meses passam rápido, sabia?
Seu, seu chato! Você tá por cima, na américa de cima! Você deveria se envergonhar de mendigar o dinheiro de um pobre sul-americano, seu capitalista de merda! Tô começando a odiar você, seu corno!