segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Fila de banco

A solidão atormentava esse ser de passos tortos. Sempre andei muito sem rumo e olhando pra baixo, sempre pra baixo! Olhar para baixo tem suas vantagens, evita pisar em dejetos caninos, tropeções e buracos. Porem, com minha desatenção e falta de sorte além de não evitar nada do que citei ainda me garantia cabeçadas em placas e trombadas. Uma vez, na fila do banco, olhava eu pra baixo e pensava na minha miserável vida. Pensava, pensava. Fila de banco é um ótimo lugar para praticar perguntas que não possuem respostas fáceis, exemplo: De onde eu vim? Pra onde eu vou? Qual o sentido da vida? Por que a fila de idosos demora mais do que a fila comum? Todo banco tem três tipos característicos de “caixa”: um velho reclamão, um sujeito novo, porém calvo e uma morena linda, por quê?
Eu me fazia as mesmas perguntas e quando eu vi que apenas um atendente era o responsável por gigantesca fila, fui além. Perguntei-me o porquê da minha solidão, o porquê de meu edredom de casal nunca ter sido antes desdobrado, só haver um chinelo em baixo da cama e apenas uma escova de dente no armário. Eu olhava fixamente para um ponto, e não via nada, estava num devaneio tão profundo que me desliguei de tudo, parecia que não estava ali, na fila do banco. Durou uns 2 minutos, esse meu devaneio, acordei de súbito! Com um arrepio na nuca e uma sensação estranha, quando meus olhos focaram de fato o local que miravam, eu a vi: morena, nem baixa nem alta, não muito gorda e não muito magra, nem bonita nem feia, porém linda a meus olhos, nota cinco! Ela me olhava com a mesma convicção que imaginou que eu olhava pra ela, no meu “transe”. Coincidentemente fixei os olhos nela e funcionou. Retribui seu sorriso e me apaixonei instantaneamente. Creio que o que mais me despertou interesse nela foi o fato dela se interessar por mim. Depois de pagar seus boletos ela ainda se virou pra mim, sorriu novamente e se foi. Minha covardia me proibiu de sair da fila e ir atrás dela, lamentei profundamente.
Depois disso, sempre voltei naquele banco atrás dela. Eu era uma espécie de “Office boy” da família, me oferecia pra pagar todo tipo de contas. Tornei-me cliente do banco, fiz seguro, poupança e titulo de capitalização. Fiquei amigo dos seguranças e às vezes ficava após ter resolvido algo, de papo com eles, na esperança de que ela aparecesse de novo. Nada! Alguns meses depois, voltei no banco com minha fatura sempre atrasada de TV a cabo, o atraso me permitia pagar “exclusivamente na agencia bancaria”. Fui com certa esperança de que a encontraria lá. Logo na entrada pude reparar que a fila era quilométrica e que minhas chances eram boas. Não a vi, perdi as esperanças e segurei as lagrimas como quem faz um esforço tremendo para carregar fardo pesado e de fácil quebra. Olhei pro chão, e então pro teto, respirei fundo e fui longe de novo, olhei fixamente pra lugar nenhum e meu devaneio, dessa vez algo triste assim, como uma bolinha de sabão, vazio, me dominou. Fiquei assim durante um tempo, quando uma voz as minhas costas me despertou: “O amigo! Olha a fila!” Voltei do transe num espanto e meus olhos viram então, um sujeito, de uns cinqüenta anos, bigode, cabelo estilo militar, nem bonito, nem feio, nem alto, nem baixo, não muito magro e tampouco gordo, ele sorriu pra mim.

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